Com a retomada do mercado aéreo internacional, os voos estão repletos de viajantes indo ver amigos e família no exterior depois de um longo período de isolamento. Em companhias como a Air Europa e Latam, a taxa de ocupação chega a superar os 90%. Diferentemente do primeiro semestre, quando a demanda fraca permitia conseguir descontos até na primeira classe, o jogo agora virou.
Com a procura crescendo em velocidade bem maior do que a oferta de voos, o difícil agora é encontrar destinos em que os preços não estejam em curva ascendente. De acordo com dados da Agência Nacional da Aviação Civil (Anac), nos 12 meses até outubro a demanda subiu percentualmente quase quatro vezes mais do que a oferta de assentos. Em muitos casos, os valores das passagens estão maiores até que no mesmo período de 2019, antes da pandemia.
Pedro Sala, diretor geral da Telefônica Global Solutions no Brasil, acabou revendo os planos diante do avanço dos preços. Espanhol, ele planejava viajar em dezembro com sua esposa e filha, de dois anos, para sua terra natal, mas desistiu. Quando começou a pesquisar, os bilhetes para os três sairiam por cerca de € 9 mil. “A primeira pesquisa eu fiz em 18 de outubro. Em 29 de outubro, pesquisei novamente e estava por € 11,5 mil (o equivalente a R$ 73,5 mil reais no câmbio atual)”. As passagens eram na categoria econômica.
Levantamento do site Kayak feito a pedido do Valor mostrou que, em média, voar para Lisboa entre 22 e 27 de dezembro deste ano está 26% mais caro (R$ 9.094 agora) do que em 2019. A pesquisa considera buscas entre 1ª de novembro e 1º de dezembro deste ano e de 2019. O aumento na tarifa veio acompanhado da alta de 89% nas buscas para o destino. Outro destino com disparada no preço é Paris, cujo bilhete em igual base estava 31% mais caro, para R$ 7,7 mil. A procura para a cidade saltou 78%.
De outro lado, o levantamento mostrou preços menores para Orlando - a passagem estava custando 30% menos (R$ 5.608) no mesmo período -, e para Cancún, com queda de 8% (R$ 6.245).
Há várias razões para a mudança no perfil de tarifa. De um lado, há recomposição de margens das companhias aéreas. O movimento ocorre também no mercado doméstico, em que o yield (preço pago pelo passageiro para voar um km) no terceiro trimestre deste ano foi de R$ 0,3986, alta de 57% ante 2020 e apenas 2,28% menor do que 2019. Já o preço médio dos bilhetes vendidos no mercado doméstico atingiu o maior nível desde 2013, de R$ 529,93.
De outro, o mercado brasileiro mostrou uma mudança no perfil de oferta e demanda que favorece uma precificação maior. Em outubro, a ocupação das aeronaves nos voos internacionais foi de 70,3%. Em abril, em meio à segunda onda de covid no Brasil, a ocupação era de 28,5% - o cenário tarifário, então, era extremamente favorável para o consumidor.
A ocupação maior chega com um crescimento mais acelerado para a demanda do que para a oferta de assentos. Somente em outubro, a demanda internacional saltou 165,9% na comparação com igual mês de 2020, enquanto a oferta de assentos avançou 44,6% - tanto a demanda quanto a oferta de outubro estão 67,4% e 60,6%, respectivamente, menores do que em igual mês de 2019.
As companhias aéreas têm calculado ocupações acima de 90% nos voos internacionais saindo do Brasil entre novembro e janeiro de 2022 - antes da pandemia, esse percentual rondava 80%. As empresas argumentam que fazer mudanças na malha aérea e colocar mais oferta de assentos no mercado não é tão simples, diante do cenário ainda instável da pandemia. A mais recente variável é a nova variante de covid-19, a Ômicron.
“Há receio de se elevar muito a oferta e não saber se vai ter venda”, disse Diogo Elias, diretor de marketing e vendas da Latam Brasil. A empresa retomou em novembro 32% da oferta de assentos do Brasil para o exterior, na comparação com o período pré-crise sanitária.
A empresa realizou promoções na Black Friday que, segundo o executivo, tiveram um resultado abaixo do esperado para os voos internacionais. Elias não descarta o surgimento da nova variante como um dos fatores que desencorajaram os viajantes.
O preço mais alto dos bilhetes, segundo o executivo da Latam, é consequência de diversos fatores. Além da oferta menor, o setor tem sido pressionado pela desvalorização do real (cerca de 50% dos custos são em dólar) e alta do combustível de aviação. De acordo com a Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear) no acumulado de janeiro a outubro, o preço do derivado do petróleo aumentou 71% na comparação com 2020. Somente em outubro, o preço subiu cerca de 20%. O combustível, historicamente, corresponde a um terço das despesas do setor.
Segundo a Latam, há ainda uma gama grande de clientes que optaram por não receber o dinheiro de volta após o cancelamento de voos e que estão remarcando a passagem para este fim de ano, limitando ainda mais o volume de assentos disponíveis para venda. “Tivemos voos internacionais que nasceram com ocupação de 60%. Temos também uma gama grande de clientes com milhas, que não foram gastas na pandemia. Quase 50% dos nossos primeiros voos para Cancún eram de pessoas resgatando pontos”, disse Elias.
Gonzalo Romero, diretor-geral da Air Europa no Brasil, destacou que a empresa tem perdido margem para manter os preços das passagens estáveis. Entretanto, o cenário para o dólar é um desafio ao turista brasileiro.
“Além disso, agora 70% dos nossos passageiros voando estão comprando passagem em um intervalo de 60 dias, característica que se via no setor de corporativo”, explicou. Antes, um passageiro de lazer costumava comprar passagens com intervalo entre 70 e 150 dias antes do voo. Quanto mais perto da viagem, mais caro fica o bilhete. “Por isso estamos incentivando os passageiros a comprar com mais tempo de antecedência”, acrescentou. A empresa tem mantido políticas de remarcação gratuita para incentivar esse movimento.
O cenário mais complexo para os preços tem sido sentido na cadeia de turismo. Frederico Levy, vice-presidente da Associação Brasileira das Operadoras de Turismo (Braztoa) disse que antes da pandemia era comum encontrar passagem para a Europa por volta de US$ 1 mil sem ser considerada um preço promocional. “Hoje, a gente vê os preços na faixa de US$ 2 mil”.
Ele destacou que atualmente todas as operadoras associadas à Braztoa já realizam vendas internacionais, o que seria uma vitória, mas o preço das passagens e o câmbio têm sido um desafio. “Vemos empresas na faixa de vendas de 20% a 25% do que era no pré-pandemia”, disse.
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